Mãe Tildes é uma grande Missionária, um Espírito de Luz que assume a roupagem de simples Preta Velha, na humildade de escrava que foi em um congá no Sul da Bahia, onde exerceu plenamente as atividades doutrinárias, buscando harmonizar as forças iniciáticas daqueles espíritos já interligados pelas origens de nossa Corrente que para ali foram, atraídos por suas faixas cármicas e por suas missões. Foi uma defensora da libertação dos escravos, para isso tendo que usar muitos dos conhecimentos sobre o transcendental daqueles senhores de engenho e sinhazinhas, buscando aliviar seus carmas e induzindo-os a se lançarem na Lei do Auxílio. É considerada a Padroeira do Lar, por seu amor e sábios conselhos para manter a união e a harmonia de casais e da família, nos atendendo em nossas complicações sentimentais e nos ajudando nos momentos difíceis de nossas vidas. Alma gêmea de Pai João de Enoque, veio com ele em diversas encarnações, especialmente quando do deslocamento das raízes africanas realizado pelos escravos que vieram para o Brasil Colônia. Uma das histórias envolvendo Mãe Tildes, que muito nos marcou por conter personagens que se encontram no Vale do Amanhecer, em cobranças e reajustes, é a da FAZENDA TRÊS COQUEIROS:
“Havia,
nas imediações de Angical, a Fazenda Três Coqueiros, uma enorme fazenda dos
Pereiras, na época, pertencente a Alfredo e Márcia, recém-casados, que a
receberam como herança. Havia uma cachoeira limitando a Fazenda Três Coqueiros
com a fazenda dos Ferreiras, nobre e rica família, porém gananciosa, com cada
membro querendo ser o mais rico, o maior, pois a vaidade e o orgulho eram as
suas características. Naquela região, perto dos Ferreiras, havia inúmeras
fazendas, grandes e pequenas, pertencentes a famílias que eram aliadas aos
Ferreiras e participavam das mesmas ideias, cheias de maldade e ódio, pois a
cobiça e a inveja faziam com que eles só pensassem em fazer o mal àqueles
daquela bela Fazenda Três Coqueiros. Eram rixas transcendentais. Os Ferreiras e
seus aliados sustentavam o ódio arraigado em seus corações. Estas duas famílias
estavam sempre em choques e os aliados faziam trincheiras e tocaias, provocando
mortes e destruições. Porém, as mortes eram só dos escravos (como diziam eles,
escravos eram pagãos e não mereciam bons tratos; eram comprados como um animal
qualquer!). Certo dia, Márcia saiu a passear a cavalo, e foi até a cachoeira,
ficando admirada com a beleza daquele lugar, daquela linda cachoeira. Sim,
aquela era a antiga Cachoeira do Jaguar, de Pai Zé Pedro, de Pai João e das Princesas!
Sabia-se que ali existira um fenômeno, há cem anos. Márcia era uma médium de
grande percepção. Parou e, deslumbrada, disse:
-
É verdade!... Aqui existiu um grande fenômeno envolvendo alguns escravos!
Nisso,
Valdemar Ferreira chegou e, abraçando a sinhazinha pelas costas, disse:
-
Aqui houve um grande fenômeno, dizem os antigos, de Pretos Velhos
forasteiros...
Imediatamente
Márcia se lembrou de que Valdemar Ferreira era o mais triste dos inimigos de
seu marido e, também, lembrou que seu esposo lhe havia dito que ela jamais
pisasse naquele local. Livrando-se de Valdemar, ela saiu correndo. Mas o
destino pregou-lhe uma peça: um pequeno escravo dos Ferreira viu Márcia ali com
Valdemar e foi contar tudo a Alfredo. Márcia já esperava um filho de Alfredo. Todos
os escravos de Valdemar odiavam a Fazenda Três Coqueiros, cheios de inveja,
porque a vida dos escravos de Alfredo era boa, levando uma vida normal. Até
mesmo os feitores de Alfredo eram bem tratados e eram bons com os escravos, o
que não acontecia com o povo dos Ferreiras. Certo dia, o filho de Zefa - da
Fazenda Três Coqueiros - começou a namorar uma crioula, escrava dos Ferreiras.
Os escravos dos Ferreiras se revoltaram contra o filho de Zefa, esfaqueando-o,
e o colocaram, semimorto, à porta de Alfredo, deixando um bilhete em que diziam
que não queriam aquele cachorro por lá e, mais, que quando o filho de Márcia
nascesse fosse mandado para Valdemar. Márcia, cansada e cheia de dores por
causa da gravidez já adiantada, ouvindo os gritos de Zefa, correu ao encontro
da velha escrava. É que Alfredo encontrara o rapaz esfaqueado e lera o bilhete.
Cheio de ira, mandou que jogassem o rapaz no pasto, longe da Casa Grande. Mãe
Zefa havia encontrado o filho e gritava por Márcia, para que ela ajudasse o
rapaz. Márcia, mesmo cheia de dores, foi ajudar Zefa, saindo com Pai Zé Pedro
para buscar o pobre escravo que havia passado a noite no relento, com urubus já
sobrevoando seu corpo. A bondosa sinhazinha mandou que levassem o rapaz para
dentro de casa e, então, houve um caso de desintegração: Márcia passou com o
ferido perto de Alfredo e este não os viu! Assim que Alfredo encontrou Márcia
mandou-a, sem explicações, para a senzala e mandou erguer um grande cercado
para mantê-la prisioneira ali. Mandou que Mãe Tildes cuidasse dela. Mãe Tildes
era confidente e grande amiga de Márcia. Alfredo comunicou que tão logo o filho
de Márcia nascesse ele o mandaria para Valdemar. Márcia cativou todos aqueles
escravos com seu amor e dedicação. Quando Zé Pedro, o velho nagô, chegou para falar
com Márcia, esta perguntou:
-
Quem é este homem?
-
É um velho nagô - respondeu Mãe Tildes - que recebe espíritos no lombo!...
-
Não, sinhazinha, não precisa ter medo! - disse Pai Zé Pedro se chegando, e se
virando para Mãe Tildes, deu um muxoxo: - Linguaruda! Conversa demais!...
Márcia
sentiu que o velho nagô tinha uma força do Céu e se afinou com ele. Numa manhã,
quando o Sol já brilhava, encantando com seus raios toda a beleza daquela
fazenda, eis que Márcia começou a passar mal e, mais tarde, a criança nasceu.
Foi grande o reboliço, e os Pretos Velhos se mobilizaram. Mãe Tildes pegou a
criança, enrolou-a numa coberta e a levou para Mãe Zefa, lá no meio do cafezal,
dizendo:
-
Vai, Zefa! Leva este menino porque Alfredo vai matá-lo!
Zefa
saiu correndo com o bebê e o levou para a casa dos Ferreiras, onde, sem saberem
o que estava acontecendo, entregou o menino à sinhazinha Emerenciana, mãe de
Valdemar, que prometeu jamais revelar que aquela criança era filha de Alfredo.
Era o grande segredo entre Mãe Zefa e Emerenciana. Zefa foi embora, e nunca
mais se teve notícias dela. Quando Mãe Tildes voltou do cafezal, levou um
susto: Márcia havia ganho mais outra criança, uma linda menina! Tinham nascido
gêmeos! Mãe Tildes começou a chamar a menina de Marcinha. Vendo a dor tão
grande de Márcia, Alfredo acreditou em sua inocência e a perdoou, mas Márcia
não quis voltar à Casa Grande. Tanto Alfredo como Márcia não sabiam que haviam
nascido duas crianças. Conheciam apenas aquela menina. Alfredo, até seu
desencarne, pensava só ter nascido a menina. Certo dia, um crioulo apareceu
para dar satisfações onde estava o menino. Mãe Tildes sofria, sem saber se
devia revelar o segredo a Márcia. Foi consultar o nagô, e este lhe disse para
jamais revelar a verdade. Fora um erro ela querer assumir a dívida de Márcia.
Por outro lado, Mãe Tildes desconfiava de Márcia, ao ver o menino que se
parecia demais com Valdemar. O nagô pediu que Márcia voltasse para a Casa
Grande, porque seu marido estava caminhando para a loucura e teria um fim muito
triste. Márcia saiu dali com o coração apertado, sabendo que Alfredo não tinha
condições de continuar a viver daquele modo. O tempo passou ligeiro e Alfredo
morreu louco. Márcia se enclausurou naquela casa. Marcinha, já mocinha, começou
a namorar o filho de Valdemar! Quando o rapaz entrou, pela primeira vez, na
Casa Grande da Fazenda Três Coqueiros, Mãe Tildes foi correndo até Pai Zé Pedro
e lhe disse que estava perdida, pois tinha cortado o carma de Márcia e, agora,
Marcinha iria se casar com o próprio irmão! Nisso, a porta se abriu e Marcinha,
feliz, abraçou Pai Zé Pedro e Mãe Tildes, dizendo-lhes que iria se casar.
-
Ele quer se casar comigo! O coronel Valdemar tem dois filhos, sabem? O mais
novo tem dois dedos emendados, um pregado no outro. Mas este não! É perfeito, e
não se parece nada com o outro...
Depois
que Marcinha saiu, Pai Zé Pedro falou:
-
Não lhe disse, Mãe Tildes, que a grandeza de Deus não tem limites? Este não é o
filho de Márcia...
E
Mãe Tildes perdeu a voz até que Marcinha se casou com aquele rapaz! No dia do
casamento de Marcinha, foi promulgada a Lei Áurea, a abolição da escravidão.
Foi uma terrível confusão. Tiros... Brigas... Amália, esposa de Valdemar,
morreu. Márcia não soube a verdade sobre seus filhos até o dia em que Emerenciana,
já para morrer, a revelou: Jacó era seu filho! Tinha dois dedos emendados, que
comprovavam ser ele filho de Alfredo, que tinha o mesmo defeito. Márcia,
prestes a desencarnar, abraçou seu filho Jacó, cheia de emoção. Mãe Tildes, já
um espírito evoluído, teve que pagar esta pena, por ter reparado um carma
indevidamente. É o que acontece com quem corta ou interfere nos destinos dos
outros!... O pessoal dos Ferreiras lançou-se contra a Fazenda Três Coqueiros.
Foi uma grande mortandade. Iluminados pela força de Deus, Mãe Tildes, Pai Zé
Pedro e duas crioulas - Uraí e Urail - fugiram para uma outra fazenda cafeeira.
Marcinha fugiu, levando consigo seu irmão Jacó. No dia seguinte, uma volante -
polícia baiana - chegou à Fazenda Três Coqueiros, onde muitos cadáveres
exalavam terrível mal cheiro, e, com muita dificuldade, impôs a ordem. Na
fazenda dos Ferreiras, ninguém triscava a mão! Vieram, de longe, velhos
coronéis e sinhorzinhos. Os pais de Alfredo e os de Márcia quiseram levar
consigo os netos Marcinha e Jacó. Estes, porém, não quiseram ir. Todos os que
passavam por ali comentavam a triste tragédia daquele povo, povo este composto
por espíritos espartanos, vindo de nossa origem e que, aqui, não suportaram as
velhas rixas. Alguns dos Ferreiras que fugiram, continuaram a se entrincheirar
para novas tragédias. Mãe Tildes e Pai Zé Pedro fugiram para o Angical. É só o
que posso dizer, pois aqui estão os malvados que precipitaram esta tragédia!
Ainda faltam alguns componentes desta história. Não posso, neste instante,
avaliar quais dos senhores e senhoras foram Ferreiras ou quais foram
Pereiras... Salve Deus! Só Deus, neste instante, poderá avaliar quem foram...”
(Tia Neiva)
Obs.:
Em suas anotações biográficas, Tia Neiva informou que Carmem Lúcia, sua filha,
era a reencarnação de Marcinha.
fonte: observações tumarã
fonte: observações tumarã
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